O dia fora terrivelmente cansativo. Eu cheguei a minha casa um bagaço. Joguei-me na cama do jeito que estava, nem sequer arranquei os sapatos... Pouco mais tarde levantei, andei até a cozinha, coloquei o pó de café no filtro de papel, enchi o recipiente da cafeteira de água no máximo aceitável e liguei a máquina. Coloquei duas fatias de pão na torradeira, retirei da geladeira uma vasilha de plástico com queijo para o sanduíche previamente cortado na padaria, destampei-a para que o queijo mais rápido chegasse à temperatura ambiente. E esperei que a cafeteira fizesse seu trabalho. Caminhei até a sala, sentei no sofá, liguei a TV num desses canais de tecnologia e assisti a mais um comercial da Inteligência Artificial. De agora por diante nossa vida será mais fácil, bem mais fácil, é o que prometem. Nem estão pensando se realmente nós necessitaremos deste avanço tecnológico. Será mais um complemento para os aplicativos de meu celular que, para ser indispensável, só faltaria fazer ligações para o qual deveriam ser sua utilidade básica, mas não é.
Meu celular vibrou ainda no bolso da camisa. Saquei e olhei-o. Havia foto de uma asiática, num filmete, a simular uma masturbação enquanto me convidava para fazer sexo sem compromisso.
A torradeira avisou que o pão estava pronto, porém, não fui à cozinha de imediato, e fiquei observando a mulher oriental se contorcer de prazer. O que houve com o mundo? — Pensei — será que estamos sendo dominados por nossa própria ganância e tecnologia?
A cafeteira começou a fazer barulho de borbulhamento indicando que o café ficara pronto. Levantei para ir pegar o café e fazer um misto, porém alguém bateu na porta. Era a vizinha do andar de cima que já entrou me questionando:
— Gostou do filmete que lhe mandei pelo WhatsApp?
— Qual filme? — indaguei. Não queria criar nenhum mau entendido, afinal, a vizinha é casada.
— O da Japonesa...
— Sim, vi. Excitante! — Ela concluiu:
— Você sabe que no Japão, quando uma mulher casada sente atração sexual por alguém, de quem gosta muito, ela pede para uma amiga solteira que faça amor com o fruto de seu desejo?
— Não. Não sabia. — Respondi.
A vizinha, casada, caminhou em minha direção e colocando a mão lá. Sim. Lá mesmo. Onde você imaginou. Deu um leve aperto e disse;
— Só que eu não sou japonesa...
(...)
O despertador tocou... Acordei ainda com a roupa de ontem, todo melado, corri para me banhar ou pegaria o engarrafamento na Paralela e chegaria atrasado. Após tomar café e mudar a roupa saí apressado. Ao entrar no elevador a vizinha do sonho me perguntou seria:
— Você viu o recado que lhe enviei pelo WhatsApp...
Respondi com um sorriso:
— Não...
Ela continuou séria até o elevador chegar à garagem e saiu em direção ao próprio carro. Eu abri o WhatsApp. Estava escrito:
“Favor comparecer a reunião de condomínio. Temos que discutir com urgência a necessidade de fazer uma taxa extra... Por favor, não falte!”
Salvador, Bahia, 06/04/2023

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